domingo, 16 de junho de 2019

Apesar dos inúmeros benefícios, aplicativos como Waze e Google Maps podem atrapalhar o trânsito.



Marina Goulart de Miranda

Na época em que aplicativos de trânsito como Waze e Google Maps não existiam, a busca dos motoristas pelo melhor caminho para fugir do engarrafamento ficava limitado ao conhecimento de cada um da cidade. Nesse cenário, sempre havia quem conhecia os caminhos pelas pequenas ruas e conseguia escapar do trânsito, mas de modo geral, a maioria das pessoas ficavam presas em grandes avenidas e ruas principais, vias que os planejadores urbanos desenharam como caminho preferencial para ir do ponto A ao B.

Agora, com esses aplicativos, uma nova camada de informação está influenciando na infraestrutura planejada nas cidades. Com smartphones e aplicativos de mapas, os motoristas conseguem ter acesso a rotas alternativas, geralmente ruas menores, quando o caminho principal se encontra congestionado. O problema, no entanto, é que essas ruas menores não tem a mesma capacidade que as avenidas e vias principais, o que pode gerar congestionamento em cruzamentos e superlotação em todas as vias.
Um estudo realizado na Universidade da Califórnia concluiu que os aplicativos de trânsito muitas vezes pioram o congestionamento nas cidades, justamente por redirecionar os motoristas para ruas residenciais, que não foram construídas para comportar um grande fluxo de veículos.  Alexandre Bayen, diretor do instituto de pesquisa, afirmou que enquanto eram poucos os motoristas que usavam os aplicativos, havia um benefício tanto para os usuários quanto para não usuários, mas com o maior acesso à informação em tempo real, os benefícios parecem desaparecer e o trânsito tende a piorar.
Pesquisadores liderados por Alexandre, fizeram simulações para mostrar que quanto mais a gente usa apps capazes de traçar rotas dinâmicas, mais a situação das ruas piora. A simulação mostra um incidente em uma via expressa quando ninguém está usando os apps e quando 20% dos motoristas estão fazendo uso.
 Resumidamente, num "mundo sem apps", a maior parte do congestionamento fica concentrada na via expressa. Quando vários motoristas são notificados de que há um caminho alternativo disponível, a situação fica consideravelmente pior na região. A simulação está disponível no vídeo a seguir:

Alexandre Bayen explicou os resultados da pesquisa com base na teoria Nash Equilibrium, segundo a qual decisões que são boas para indivíduos podem ser terríveis para grupos. Ainda segundo ele, a situação tornou-se tão ruim nas ruas residenciais dos Estados Unidos que moradores estão colocando placas falsas de desvios para que os motoristas não entrem nas vias. “Outros moradores estão pagando cidadãos para fingir que são carros presos no tráfego ao segurar o celular na mão enquanto andam nas ruas. Assim, os algoritmos dos aplicativos aprendem a evitar o bairro”.
Esse problema também está sendo vivenciado no Brasil. A revista Veja (2018) apresentou em uma matéria que de acordo com o o ex-gerente de operações da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) e atual vereador da cidade, Ricardo Teixeira (PROS), os moradores do Estado de São Paulo também estão insatisfeitos com a utilização de rotas alternativas pelos motoristas, sugeridas pelos aplicativos de trânsito. “A CET sinaliza as rotas dos grandes corredores, avenidas e ruas que comportam esse tráfego de passagem do centro para o bairro, mas os aplicativos te jogam para ruas que não estão preparadas. Diversos bairros de São Paulo pedem o fechamento do bairro ou da via para dificultar o trânsito de passagem”. Ricardo afirma ainda que a facilidade dos aplicativos é que você não se perde mais, a sinalização da cidade está perdendo importância e o aplicativo é a única forma de avisar como o trânsito está na cidade.
Para o professor de economia do Insper, Rodrigo Moita, o efeito positivo de diluir o fluxo dos carros por vias secundárias é maior que o efeito negativo gerado pelos congestionamentos. Mas há alternativas para diminuir o engarrafamento dentro da cidade. “Desde a construção de um abrangente sistema de transporte público até a alteração dos horários de trabalho, para evitar que todos dirijam no mesmo horário do dia”.
Para a idealizadora do projeto Bike é Legal, Renata Falzoni, o problema do congestionamento só será resolvido promovendo o transporte público e ativo (a pé ou de bicicleta). “Você não tem como resolver a situação procurando dar mais espaço ou incentivando o uso dos carros.” investir na construção de novas rodovias significa investir num modelo falido, não tem que construir mais viadutos, e sim conectar calçadas e ciclovias. Do jeito que está a cidade de São Paulo não precisa construir, precisa redesenhar.
Para o professor de economia do Insper, a solução também não é construir novas vias. Segundo ele, “mais rua atrai mais carros”. “Se uma via é congestionada, por exemplo a Marginal Tietê, o Waze vai desviar os motoristas para avenidas paralelas que vão acabar congestionadas também. Para acabar com o problema, a prefeitura duplica a marginal. O que acontece? A marginal fica livre, e os motoristas agora vão desviar das rotas paralelas para usar a marginal mais rápida. No fim das contas, ela volta a ficar congestionada”, exemplifica Moita.
Felizmente, a quantidade de pessoas que andam com veículos individuais está caindo.  Para Ricardo Teixeira “andar em um carro sozinho usa um espaço urbano saturado, o individual para média e longa distância não cabe mais. O táxi e o Uber criam facilidade para que você ande com mais gente no mesmo trajeto”. O diretor de pesquisa da Universidade da Califórnia também concorda que a solução está no colaborativo. “Temos que aprender a trabalhar colaborativamente e isso significa que os aplicativos têm que espalhar os motoristas por rotas paralelas que funcionam bem com a infraestrutura das rodovias. Isso se os aplicativos estiverem dispostos a colaborar”.



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