quinta-feira, 12 de junho de 2025

Foco roubado: como as redes sociais sequestraram nossa atenção

Disciplina: Redes Sociais e Virtuais EGC5020

Autor: Eduarda Becker
Matrícula: 21202426

Você já teve a sensação de que está perdendo a capacidade de se concentrar? De que sua mente está sempre pulando de estímulo em estímulo, como se algo a puxasse constantemente para longe do presente? Essa inquietação, cada vez mais comum, despertou a curiosidade do jornalista britânico Johann Hari. Em seu livro Stolen Focus: Why You Can’t Pay Attention and How to Think Deeply Again ele se propôs a investigar por que estamos nos tornando incapazes de focar e o que está por trás desse fenômeno.


Fonte: Amazon


Logo de início, Hari percebeu algo alarmante: nem mesmo os maiores estudiosos da mente humana estavam imunes à distração. Um dos exemplos mais simbólicos é o do psicólogo Roy Baumeister, referência mundial nos estudos sobre autodisciplina. Baumeister passou décadas analisando os mecanismos por trás do autocontrole. Ainda assim, ao conversar com Hari, admitiu algo inquietante: também estava se rendendo à distração digital. “Quando começo a me sentir mal, jogo um jogo no celular, e isso se tornou divertido […] consigo ver que não estou sustentando a concentração como antes. Simplesmente estou cedendo.” Essa confissão é simbólica: se até uma das maiores autoridades em disciplina mental está se deixando levar pelas distrações do mundo digital, o que dizer da sociedade como um todo?


Diante disso, Hari passou a questionar se a queda na nossa capacidade de foco seria uma falha individual ou se haveria algo maior em jogo. Sua conclusão é clara: o problema não é apenas pessoal, é sistêmico. “Nossa capacidade de prestar atenção está sendo corroída, não porque sejamos fracos, mas porque forças muito poderosas estão fazendo isso conosco”. Redes sociais, aplicativos e jogos são projetados com um único objetivo: capturar e manter a atenção o máximo de tempo possível. Isso não é por acaso, é um modelo de negócio que se baseia justamente em vender a atenção para anunciantes. O resultado? Um ambiente online que constantemente distrai, interrompe e estimula.


Pesquisadores têm quantificado os danos causados por esse ambiente hiperestimulante. A pesquisadora Gloria Mark aponta que a exposição constante a interrupções leva o cérebro a se reprogramar. Com o tempo, mesmo sem a presença de notificações, o comportamento de auto-interrupção tende a se manifestar. O pensamento fica fragmentado, e torna-se impossível manter a concentração por longos períodos, mesmo quando se deseja. Essas microdistrações têm efeitos acumulativos. Segundo o neurocientista Michael Posner, após uma interrupção durante uma tarefa, leva-se em média 23 minutos para recuperar o mesmo nível de concentração anterior. Agora imagine quantas vezes você é interrompido por dia, e quanto tempo de foco real é perdido ao longo da semana, do mês, do ano.


Esse foco roubado impacta diretamente a capacidade de realizar projetos e aprofundar relações. De acordo com Hari, vive-se uma vida cada vez mais cheia de estímulos e cada vez mais vazia de clareza: 


“Você quer ler um livro, mas é puxado pelas notificações. Quer passar um tempo de qualidade com seu filho, mas continua checando o e-mail. Quer começar um negócio, mas se perde em comparações e distrações nas redes sociais. E, por fim, não sobra tempo, nem espaço, para pensar com profundidade.” 

Ainda, Hari afirma que a crise da atenção compromete a capacidade de agir como sociedade. Questões urgentes, como as mudanças climáticas, exigem cooperação e concentração coletiva ao longo de muitos anos. Da mesma forma, a democracia depende da habilidade de prestar atenção, distinguir fatos de fantasias e cobrar soluções dos representantes. Ao se estar constantemente distraído, fica-se à mercê da desinformação. Perde-se a capacidade de pensar criticamente e, com isso, coloca-se em risco a própria liberdade.

Diante de tudo isso, a resposta mais comum tem sido individualizar o problema: aplicativos para foco, técnicas de produtividade, bloqueadores de sites. Porém, embora essas ferramentas possam ajudar, Hari alerta que elas não bastam. Tentar resolver o problema apenas com hábitos ou disciplina é como “tentar secar o chão com baldes enquanto a torneira segue aberta”. É preciso pensar de forma coletiva e estrutural. 


Hari utiliza uma metáfora interessante: “É como dirigir um carro com o para-brisa coberto de lama. Você não consegue enxergar o caminho, nem voltar para casa. Antes de resolver qualquer outra coisa, você precisa limpar o para-brisa.” Talvez esse seja o maior desafio hoje: limpar o para-brisa da mente para voltar a enxergar a vida como ela é, e não como os algoritmos querem que ela pareça. 


Referências:

MARK, Gloria. Interruptions. In: Multitasking in the Digital Age. Cham: Springer International Publishing, 2015. p. 33-51.


HARI, Johann. Stolen focus: Why you can't pay attention: and how to think deeply again. Crown, 2023.


POSNER, Michael I. Measuring alertness. Annals of the New York Academy of Sciences, v. 1129, n. 1, p. 193-199, 2008.


Declaração de IA e tecnologias assistidas por IA no processo de escrita: Declaro que, durante a preparação deste trabalho, utilizei ferramentas de IAG (Chat GPT) para aperfeiçoamento do texto e melhoria da legibilidade. Após o uso destas ferramentas, os textos foram revisados, editados e o conteúdo está em conformidade com o método científico. Assumo total responsabilidade pelo conteúdo da publicação.

Ecoando Vozes: Do Gravador às Redes na Resistência Indígena ao Paradigma Integracionista

Ecoando Vozes: Do Gravador às Redes na Resistência Indígena ao Paradigma Integracionista

Disciplina: Redes Sociais e Virtuais
Autor: Enzo Lencioni Lovate
Matrícula: 21200010

 

Fonte: APIB (2023)

Uma das heranças mais marcantes no cotidiano dos povos indígenas deixada, ou melhor, imposta e perpetuada pela colonização no Brasil, é a ideia do paradigma integracionista. Uma ideia que assume que os povos indígenas, bem como demais povos tradicionais como quilombolas, devem ser assimilados ao padrão de vida da sociedade dominante, de uma forma que desconsidera diversidades de costumes, cosmologias, línguas, formas próprias de organização e conhecimento, e o próprio direito à demarcação e permanência em suas terras (MACHADO; RAIOL, 2024). Essa lógica sustenta o que Sawaia (2014) denomina de inclusão perversa, uma forma de inclusão que, embora aparente ser positiva, aprofunda desigualdades ao impor critérios que ignoram contextos históricos e estruturais de exclusão.


Junto a esse pacote colonizador, para além do próprio genocídio direto desses povos que ocorre desde a invasão às terras brasileiras em 1500, surgem questionamentos preconceituosos atualmente diante do uso de tecnologias, como as redes sociais, pelos povos indígenas. Questionamentos que partem de uma visão equivocada de que o indígena deve se manter isolado e alheio às ferramentas da modernidade. Esse olhar reducionista nega aos povos originários o direito à transformação, à comunicação e à reivindicação de seus direitos por meio das mídias digitais. Ao apropriarem-se criticamente das tecnologias, os povos indígenas não deixam de ser indígenas — ao contrário, utilizam essas ferramentas para fortalecer suas lutas, valorizar suas culturas, registrar suas histórias e denunciar as violências que continuam sofrendo. O uso das redes sociais, portanto, representa não uma contradição, mas uma estratégia contemporânea de resistência e reexistência.

Nesse sentido, o processo de apropriação das tecnologias pelos povos originários não é recente. Um marco histórico importante é a atuação de Mário Juruna, primeiro deputado federal indígena eleito no Brasil, em 1982. Juruna, do povo Xavante, empunhava um gravador como arma política, denunciando a hipocrisia dos parlamentares ao registrar promessas feitas e depois negadas. Sua atuação provocou incômodo nas elites políticas e midiáticas, sendo inicialmente exaltado como símbolo de autenticidade e depois ridicularizado, reforçando estereótipos de um “índio fora de lugar” no Congresso. Como aponta Graham (2011, p. 272, apud GOMES, 2021), “povos indígenas são particularmente vulneráveis à manipulação da imagem por causa de sua extrema marginalidade e relativa falta de poder [...]”.


Fonte: pdt.org

Na contemporaneidade, as vozes indígenas se multiplicam e ganham força por meio das redes digitais. Um exemplo notável é a própria Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), uma instância de aglutinação e referência nacional do movimento indígena no Brasil, criada em 2005 durante o Acampamento Terra Livre (ATL), principal assembleia nacional dos povos indígenas do Brasil. A APIB surge da necessidade de unificação das lutas indígenas em nível nacional, fortalecendo as articulações entre organizações regionais, tendo assim como missão a promoção e defesa de direitos dos povos indígenas, em especial o direito à terra, à cultura e à autodeterminação.



Dentro desse cenário de resistência comunicacional, destaca-se também a Mídia Indígena, rede fundada em 2017 por Erisvan Bone Guajajara, que reúne jovens comunicadores indígenas de diversas etnias. A iniciativa atua como uma plataforma de resistência, contra-informação e afirmação identitária, rompendo com o silenciamento histórico imposto pelos meios tradicionais. Premiada internacionalmente, a Mídia Índia contribui para desconstruir estereótipos e difundir a diversidade das culturas indígenas brasileiras (APIB; IPRI, 2021, p. 135). Outro exemplo importante é o Cine Kurumin - Festival Internacional de Cinema Indígena, considerado uma janela relevante para a expressão da produção audiovisual indígena. 


Diante do histórico de silenciamento, exclusão e apagamento imposto aos povos indígenas, bem como ameaças do Marco Temporal e a atual aprovação Projeto de Lei 2159/2021, conhecido como PL da Devastação, torna-se urgente reconhecer e valorizar as estratégias contemporâneas de resistência que esses povos têm protagonizado, especialmente por meio da apropriação crítica das tecnologias digitais. Hoje nosso país conta com avanços nas representatividades, como Sônia Guajajara, primeira ministra indígena da história do Brasil, Txai Suru, jovem liderança, ecoando vozes de seu povo na COP-26, Ailton Krenak ativista de referência internacional, entre tantos outros nomes. Contudo, mesmo diante de avanços, a resistência não é uma página virada na história. E como bem alerta o livro Amazônia Digital (Malini et al., 2009),  inclusão digital só será justa se for, antes de tudo, intercultural e emancipada da lógica colonizadora que ainda marca boa parte das políticas públicas no Brasil.








Referências


MACHADO, Amirele Porto; RAIOL, Raimundo Wilson Gama. A tecnologia como ferramenta para a luta indígena: decolonizando a internet. Revista de Direitos Humanos e Efetividade, Encontro Virtual, v. 10, n. 1, p. 74–85, jan./jul. 2024. e-ISSN: 2526-0022


SAWAIA, B. (org.). As artimanhas da exclusão: análise psicossocial e ética da desigualdade social. 14 ed. Petrópolis: Vozes, 2014. 

GOMES, Dhiogo Rezende. Ecos, tons e megapixels do modo Maíra: os Tentehar-Guajajara na guerra da comunicação no contexto da T.I Cana Brava. Anais da IX Reunião de Antropologia da Ciência e Tecnologia, 2021.

GRAHAM, Laura R. Citando Mario Juruna: Imaginário linguístico e a transformação da voz indígena na imprensa brasileira. Mana, Rio de Janeiro, v. 17, n. 2, p. 271–232, 2011.

APIB; IPRI. Uma anatomia das práticas de silenciamento indígena: relatório sobre criminalização e assédio de lideranças indígenas no Brasil. Brasília: APIB/IPRI, 2021.

MALINI, Fábio et al. (org.). Amazônia Digital: tecnologia, cultura e cidadania na era da informação. São Paulo: Peirópolis, 2009.

Declaração de IA e tecnologias assistidas por IA no processo de escrita: durante a preparação deste trabalho, o autor utilizou ferramentas de IAG (ChatGPT) no processo de planejamento, para aperfeiçoamento do texto e melhoria da legibilidade. Após o uso destas ferramentas, os textos foram revisados, editados e o conteúdo está em conformidade com o método científico. O autor assume total responsabilidade pelo conteúdo da publicação. 




INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E SOCIEDADE: UMA ANÁLISE ABRANGENTE

Disciplina: Redes Sociais e Virtuais EGC5020
Autor: Wenderson Ferreira
Matrícula: 20105295

 

INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E SOCIEDADE: UMA ANÁLISE ABRANGENTE.

 

No final de 2022 uma empresa conseguiu atrair os olhos do mundo para a nova revolução industrial, a era da Inteligência Artificial (IA). Apensar de a muito tempo ser um desejo humano a ponto de se tornar ficção científica hollywoodiana em um universo que máquinas inteligentes interagem e até tentando exterminar a raça humana, a Open AI conseguiu, com seu Chat GPT, nos aproximar dessa ideia que era vista nos filmes e então fazer com que discutamos o futuro da IA e as diretrizes que precisam serem tomas para o uso consciente.

A plataforma da Open AI se popularizou tanto que reduziu a quantidade de pesquisas feitas no Google, hoje o Chat GPT está na palma da mão de milhões de pessoas e sendo usada para pesquisas rotineiras sobre compras, moda, entretenimento, educação e até saúde. A contrapartida não é diferente, as empresas estão usando para conseguir atrair ainda mais público para seus produtos e serviços, além de reduzir custos com marketing e folha salarial. Mas, ao contrário do que muitos pensam, a IA não é alto tão contemporâneo assim.

A Inteligência Artificial (IA), cujo surgimento remonta à década de 1950, com a Dartmouth College Conference em 1956 marcando seu início oficial, tem se tornado uma força transformadora em nosso cotidiano. Pesquisadores como John MacCarthy, Marvin Minsky, Alan Newell e Herbert Simon são reconhecidos como os pais da área, estabelecendo os fundamentos deste fascinante campo da Computação. Desde sua concepção, a IA tem sido cercada por enormes expectativas, alternando entre períodos de grande entusiasmo e financiamento, e fases de decepção e escassez de recursos, conhecidas como "AI Winter". Atualmente, vivemos um novo período de otimismo, impulsionado por três fatores fundamentais: o baixo custo de processamento e memória, o advento de novos paradigmas como as redes neurais profundas, e a vasta quantidade de dados disponíveis na internet devido ao uso massivo de redes e mídias sociais (Sichman, 2021).

A presença da IA é cada vez mais acelerada, manifestando-se em atividades rotineiras como a leitura de e-mails, o funcionamento de máquinas de lavar, a condução de veículos autônomos e a curadoria de filmes em plataformas de streaming. Embora a menção de que um produto ou serviço utiliza IA muitas vezes sirva como estratégia de marketing, nem sempre isso garante superioridade ou uso significativo da tecnologia. O grande crescimento da IA é atribuído, em grande parte, ao rápido desenvolvimento em quatro eixos tecnológicos: extração, armazenamento, transmissão e processamento de dados4. Avanços em sensores e câmeras, novos materiais para armazenamento, a revolução das redes de computadores e da internet (com mais "coisas" conectadas do que pessoas), e computadores mais eficientes e acessíveis contribuíram para o fenômeno da big data. O big data, inicialmente caracterizado por Volume, Variedade e Velocidade, gerou uma imensa demanda por ferramentas computacionais capazes de extrair conhecimento útil e relevante para a tomada de decisões, impulsionando a IA dos laboratórios para produtos e serviços que geram ganhos econômicos e sociais (Carvalho, 2021).

A despeito do sucesso e da onipresença da IA, o termo não possui uma definição acadêmica única. Em vez de definições, é mais adequado caracterizar os objetivos da área: desenvolver sistemas para realizar tarefas que, no momento, são melhor executadas por seres humanos ou que não possuem solução algorítmica viável pela computação convencional. A principal diferença reside na natureza dos problemas que a IA busca resolver. Enquanto a computação convencional lida com problemas de soluções exatas (como o projeto de uma ponte ou uma receita culinária), a IA foca em problemas sem uma solução exata ou única, como a definição de um pacote de turismo, diagnósticos médicos ou reconhecimento de imagens9. A abordagem de tentar gerar todas as soluções possíveis para esses problemas é, na prática, inviável devido à vastidão de possibilidades. Humanos solucionam esses problemas usando mecanismos de busca e poda, selecionando a melhor solução de acordo com certos critérios e aprendendo com as escolhas feitas (Sichman, 2021).

O domínio da IA é uma coleção de modelos, técnicas e tecnologias que incluem busca, raciocínio, representação de conhecimento, mecanismos de decisão, percepção, processamento de linguagem natural, tratamento de incertezas e aprendizado de máquina. Para isso, a IA utiliza paradigmas distintos: simbólico (identificação e representação formal do conhecimento), conexionista (redes neurais artificiais inspiradas no cérebro, capazes de aprender a partir de exemplos), evolutivo (métodos probabilísticos de busca de soluções inspirados na teoria da evolução) e probabilístico (modelos baseados em independência condicional e relacionamentos causais). Uma contribuição significativa para a área foi o conceito de agente inteligente, proposto em 1995, que se tornou um paradigma integrador. Agentes inteligentes são sistemas computacionais encapsulados, situados em um ambiente, capazes de ação autônoma e flexível para cumprir seus objetivos. A autonomia é um conceito crucial, com múltiplas definições relacionadas ao design, ambiente, objetivos e motivações do agente. A autonomia em relação às motivações é a mais discutida, levantando questões sobre o grau de liberdade de escolha que um dispositivo inteligente deve ter, como no caso de um robô aspirador versus um agente de reservas de viagens20. A discussão sobre graus de autonomia, baseada em métricas de confiança e histórico de interações, é um desafio, especialmente na integração de sistemas inteligentes com humanos em sistemas sociotécnicos (Sichman, 2021).

O protagonismo em IA tem levado a uma corrida por investimentos por parte de diversos países23. Um estudo da McKinsey em 2018 previu que bens e serviços baseados em IA podem valer cerca de 13 trilhões de dólares em 2030, e que a IA aumentará as distâncias de desempenho entre países líderes e os demais2324. Países como China, Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Rússia, Alemanha, Noruega, Suécia, França e Índia são considerados líderes em IA, investindo pesadamente na captação, retenção e formação de talentos, e na criação de estruturas de pesquisa2526. A China, por exemplo, busca ser líder mundial em IA até 2030, com grandes investimentos em cidades inteligentes, defesa e manufatura, e empresas como Baidu desenvolvendo carros autônomos2728. O Reino Unido, que já possui alta densidade de startups de IA na saúde, projeta ter 16% do mercado mundial de IA até 203029. A França, com um plano de investimento de US$ 1,8 bilhão até 2022, visa se tornar um dos líderes globais, focando na criação de institutos e recrutamento de pesquisadores30. No Brasil, os movimentos de estímulo à pesquisa e inovação em IA são vistos como isolados e sem estratégia clara, levando o país a um papel de futuro consumidor de produtos e serviços baseados em IA (Carvalho, 2021, p. 22-25).

Apesar dos inegáveis avanços, a IA, como qualquer tecnologia, pode ser utilizada de forma incorreta ou perigosa. A preocupação com a automação é antiga, remontando a discussões de filósofos como Platão sobre os efeitos da escrita na memória. Filmes de ficção científica frequentemente retratam a IA como vilã, contribuindo para o receio das pessoas. Irving John Good (1966) especulou sobre o risco de máquinas ultra inteligentes superarem a inteligência humana, levantando questões éticas sobre como lidar com essas máquinas (Sichman, 2021). Dietterich e Horvitz (2015) elencaram cinco classes de riscos: falhas (bugs), segurança cibernética (vulnerabilidade a ataques), "aprendiz de feiticeiro" (IA executando comandos literalmente sem entender a intenção humana), autonomia compartilhada (desafios na transição de controle entre humanos e IA) e impactos socioeconômicos (distribuição de empregos e economia). No mercado de trabalho, a IA pode eliminar atividades repetitivas, liberando humanos para tarefas mais desafiadoras e potencialmente reduzindo horas de trabalho, um fenômeno comparável à Revolução Industrial (Carvalho, 2021).

Diante desses riscos e potenciais impactos, a discussão sobre a IA responsável é fundamental. Virginia Dignum (2019) propõe uma postura ética em três instâncias: no processo de projeto dos sistemas, no projeto do comportamento dos sistemas, e no código de conduta dos projetistas e desenvolvedores. Sua abordagem ART of AI enfatiza a prestação de contas (accountability) – a necessidade de a IA explicar suas decisões; a responsabilidade (responsibility) – o papel das pessoas e a capacidade da IA de responder por decisões; e a transparência (transparency) – a necessidade de descrever e reproduzir os mecanismos de decisão da IA, especialmente para modelos "caixa-preta". A IA explicável (XAI) busca justamente permitir que os usuários obtenham informações sobre como os modelos de IA, em particular os de aprendizado profundo, tomam decisões. Além disso, a ética no comportamento da IA envolve a incorporação de normas e valores morais da sociedade humana nos sistemas de IA (Sichman, 2021).

Outros aspectos cruciais da IA responsável, incluem a IA justa, que busca evitar decisões preconceituosas ou com viés, muitas vezes originados nos dados de treinamento utilizados para gerar os modelos. A IA transparente é vista como um fator crítico para a confiança das pessoas nas decisões da IA, com modelos variando de "caixa-preta" (não interpretáveis) a "caixa-branca" (totalmente compreensíveis). A privacidade e proteção de dados é outro pilar, garantindo o controle individual sobre a coleta, uso e compartilhamento de dados pessoais, com regulamentações como o GDPR europeu e a LGPD brasileira buscando aumentar a transparência e fiscalizar o uso de dados (Carvalho, 2021).

A regulação da IA é um tema de debate global e já está em andamento em vários países. Há um dilema entre evitar danos sem regulação e limitar inovações com regulação excessiva. Há quem defenda que a regulação deve focar nas aplicações da IA, e não na tecnologia em si, dada a dificuldade de definir o que é IA e a lentidão dos processos regulatórios. Algumas direções propostas para a regulação incluem proibir o uso de IA em armamentos autônomos, atribuir responsabilidade por danos a pessoas (desenvolvedores, proprietários ou usuários), exigir que aplicações de IA se identifiquem claramente como máquinas, proteger a privacidade e garantir que a IA não amplifique preconceitos existentes. A regulação da IA é um problema que transcende a tecnologia, exigindo contribuições das ciências sociais e um debate amplo com a sociedade para ser clara e duradoura (Carvalho, 2021).

Em conclusão, a Inteligência Artificial é uma realidade que já se integra intimamente em nossas vidas. A questão não é mais se teremos IA, mas sim como a teremos. Para garantir que a IA beneficie a todos e que os riscos sejam minimizados, é imperativo que seu desenvolvimento e uso sejam responsáveis, ou seja, que a IA seja justa, transparente e que respeite a privacidade das pessoas. O propósito final de qualquer nova tecnologia deve ser melhorar a vida humana, sem deixar ninguém para trás (Carvalho, 2021). Nas palavras do fundador da Cibernética, Norbert Wiener, citadas em 1960: "Se usarmos, para atingir nossos objetivos, um órgão mecânico em cujo funcionamento não podemos interferir de forma eficaz... é melhor estarmos bem certos de que o propósito colocado na máquina é aquele que realmente desejamos" (Sichman, 2021, p. 46). Esta reflexão serve como um lembrete contínuo da importância de alinhar os objetivos da IA com os valores humanos e sociais.




REFERÊNCIAS

SICHMAN, Jaime Simão. Inteligência Artificial e sociedade: avanços e riscos. ESTUDOS AVANÇADOS, São Paulo, v. 35, n. 101, p. 37-47, 2021.

CARVALHO, André Carlos Ponce de Leon Ferreira de. Inteligência Artificial: riscos, benefícios e uso responsável. ESTUDOS AVANÇADOS, São Paulo, v. 35, n. 101, p. 21-35, 2021.



Declaração sobre o uso de Inteligência Artificial (IA) e tecnologias assistivas no processo de escrita:
Durante a elaboração deste trabalho, Eu Wenderson Ferreira, o autor, utilizei ferramentas de inteligência artificial generativa (IAG): NotebookLM, nas etapas de planejamento, aprimoramento textual e melhoria da legibilidade. Todo o conteúdo produzido com o auxílio dessas ferramentas foi posteriormente revisado, editado e validado, assegurando sua conformidade com os princípios do método científico. O autor assume total responsabilidade pelo conteúdo desta publicação.

Ensinar e Aprender no Mundo Conectado

Ensinar e Aprender no Mundo Conectado:
Desafios Éticos da IA e das Redes Sociais

Disciplina: Redes Sociais e Virtuais - EGC5020

Autora: Emanuella Paula de Jesus Cardoso
Matrícula: 22103559

O início da terceira década do século XXI apresenta uma cultura juvenil significativamente mediada pelas plataformas de redes sociais digitais (Santos, 2022b). Tecnologias que antes eram vistas como mera distração passaram a desempenhar papéis fundamentais no aprendizado e nas interações sociais (Educamundo, 2025). A pandemia de COVID-19 acelerou essa transição, revelando a urgência em compreender o papel dessas tecnologias na educação (Valente; De Almeida, 2022).

A geração nascida a partir de 1995 cresceu imersa na internet e nos smartphones, utilizando plataformas digitais para mediar relações sociais e até mesmo a percepção entre público e privado com esse cenário impõe desafios e oportunidades não apenas no campo social e psicológico, mas especialmente na educação (Santos, 2022b).

Este artigo tem como objetivo contextualizar e refletir sobre a educação mediada pelas tecnologias digitais e pelas redes sociais, que estão em contato permanente com os estudantes (Santos, 2022a). Analisa-se a influência dos algoritmos, o papel da inteligência artificial na educação e as redes sociais como espaços de formação cidadã (Educamundo, 2025). Justifica-se essa discussão pela crescente presença dessas ferramentas no cotidiano escolar e social, com vistas a compreender melhor o fenômeno e fomentar reflexões sobre seus impactos na aprendizagem e na formação cidadã (Santos, 2022a).

Educação com Inteligência Artificial

A inteligência artificial (IA) na educação se manifesta de diversas formas, desde algoritmos simples até sistemas complexos (Santos, 2022a) eles são definidos como conjuntos de regras e procedimentos lógicos para a solução de problemas, são a base dos sistemas digitais (Santos, 2022b). Na educação, a IA aparece em chatbots, motores de aprendizagem adaptativos, sistemas de recomendação e correção automatizada de avaliações (Valente; De Almeida, 2022).

Entre seus benefícios, destaca-se a personalização do ensino, adaptando-se às necessidades específicas de cada aluno (Valente; De Almeida, 2022) podendo identificar lacunas de aprendizagem e sugerir percursos personalizados, além de utilizar recursos interativos que aumentam a motivação dos alunos (Valente; De Almeida, 2022).

Contudo, há desafios importantes, como a "dataficação" da educação, as plataformas coletam e processam dados em grande escala, criando perfis detalhados dos alunos, o que levanta preocupações sobre privacidade e uso comercial dessas informações (Santos, 2022b; Valente; De Almeida, 2022). Esses dados podem ser usados para publicidade direcionada ou decisões automatizadas que não consideram a complexidade da trajetória de aprendizagem de cada aluno.

Outro ponto crítico é a ética no uso dos algoritmos, muitas vezes “caixas-pretas” cujo funcionamento é opaco (Santos, 2022b) e não se sabe quem define os critérios de análise, nem se é saudável expor crianças a monitoramento constante por sistemas automatizados (Valente; De Almeida, 2022). A hiper personalização também pode limitar o acesso a conteúdos diversos, criando “câmaras de eco”, como já ocorre nas redes sociais (Valente; De Almeida, 2022).

A possível substituição do professor ou mudança em seu papel pedagógico também gera preocupação diante da adoção massiva de tecnologias sem validação adequada, podendo enfraquecer o papel do educador, sobretudo se faltar formação técnica e pedagógica (Valente; De Almeida, 2022). Garantir que essas tecnologias respeitem o direito à educação e cumpram metas como o ODS 4 exige supervisão rigorosa das empresas de EdTech, assegurando que dados sejam utilizados com responsabilidade (Valente; De Almeida, 2022).

Redes Sociais e Educação Cidadã

As redes sociais são hoje parte essencial da vida dos jovens, mediando suas interações, comunicação e construção identitária (Santos, 2022b), para muitos, o smartphone é uma extensão do corpo, e comunicar-se por essas plataformas tornou-se uma exigência social (Santos, 2022b).

Essas plataformas podem ser espaços de aprendizagem, troca de ideias e mobilização, ferramentas como Facebook, Instagram, YouTube, X (Twitter), WhatsApp e Pinterest são usadas com fins educacionais (Educamundo, 2025). Projetos como o Juventudes do SESC SP utilizaram WhatsApp para distribuir materiais e promover protagonismo juvenil; experiências como a da EMEF Badra Perus usaram Facebook e WhatsApp para engajar alunos durante o ensino remoto (Valente; De Almeida, 2022).

Entretanto, o uso das redes sociais levanta questões delicadas sobre desinformação, cidadania e democracia, os algoritmos são projetados para maximizar engajamento, privilegiando conteúdos polarizadores, sensacionalistas ou até falsos (Santos, 2022b). Fake news e teorias da conspiração geram reações intensas e alto tráfego, tornando-se lucrativas para as plataformas (Valente; De Almeida, 2022).

Além disso, os algoritmos criam bolhas de informação — as “caixas de ressonância digital” — que limitam o contato com pontos de vista divergentes, ampliando a polarização e dificultando o diálogo democrático (Santos, 2022b), afetabdo diretamente a formação de opinião política e a qualidade do debate público (Santos, 2022a).

A superficialidade das interações digitais, associada à lógica do engajamento, pode reduzir a empatia, aumentar a agressividade e comprometer a saúde mental dos jovens, impactando sua autoestima e segurança (Santos, 2022a). Apesar dos riscos, as redes sociais também possibilitam a mobilização de minorias e a democratização do acesso à informação, nesses contextos, o papel do professor como curador de conteúdos e mediador crítico é fundamental (Santos, 2022b).

A relação entre redes sociais e controle social é complexa, pois os algoritmos são opacos e pertencem a grandes corporações que visam principalmente o lucro, representando o que Santos (2022b) define como “capitalismo de vigilância”, além disso, a concentração de poder nas mãos de poucas plataformas impõe limitações à liberdade dos usuários (Santos, 2022a), assim como acontece no mercado de EdTech (Valente; De Almeida, 2022).

A integração entre tecnologias digitais, inteligência artificial e redes sociais na educação e na sociedade representa um processo multifacetado, as redes sociais moldam a forma como os jovens interagem e acessam informações e os algoritmos que as regem priorizam o lucro, o que favorece a desinformação e a polarização e a IA, por sua vez, oferece possibilidades de personalização, mas acarreta riscos significativos relacionados à privacidade e à ética no tratamento de dados. Os desafios são numerosos: distração em sala de aula, ansiedade juvenil, falta de preparo docente, desigualdades digitais e a concentração de poder nas mãos de empresas privadas, mas há também oportunidades: personalização do ensino, comunidades de aprendizagem, desenvolvimento de habilidades digitais e ampliação do acesso ao conhecimento.

O futuro da educação dependerá de nossa capacidade de combinar ensino presencial e digital de maneira ética, crítica e transformadora, formando sujeitos capazes de navegar com responsabilidade no ecossistema digital e exercer plenamente sua cidadania.

Referências

Guia completo sobre educação nas redes sociais para educadores | Blog do Educamundo. , 5 maio 2025. Disponível em: <https://educamundo.com.br/blog/guia-completo-educacao-nas-redes-sociais/>.

SANTOS, Rodrigo Otávio dos. A relação público/privada na juventude mediada pelas plataformas de redes sociais digitais. Cadernos Metrópole, v. 24, p. 871–890, 8 ago. 2022. 

SANTOS, Rodrigo Otávio dos. Algoritmos, engajamento, redes sociais e educação. Acta Scientiarum. Education, v. 44, 2022. 

VALENTE, Por José Armando; DE ALMEIDA, Bianconcini. Tecnologias digitais, tendências atuais e o futuro da educação. 2022.  Declaração sobre o uso de Inteligência Artificial (IA) e tecnologias assistivas no processo de escrita:
Durante a elaboração deste trabalho, Eu Emanuella Cardoso, a autora utilizei ferramentas de inteligência artificial generativa (IAG), ChatGPT, Zotero e NotebookLM, nas etapas de planejamento, aprimoramento textual e melhoria da legibilidade. Todo o conteúdo produzido com o auxílio dessas ferramentas foi posteriormente revisado, editado e validado, assegurando sua conformidade com os princípios do método científico. A autora assume total responsabilidade pelo conteúdo desta publicação.