Aluno: Túlio Gonçalves Sodré
Matrícula: 16101448
Uma das premissas fundamentais de uma democracia é o direito de
opinião e livre manifestação de ideias, que muitas vezes contribuem para a
construção de soluções de problemas existentes na sociedade. Essas ideias dificilmente
são uma unanimidade e para destravar as divergências e chegarmos a soluções factíveis
aplicadas na prática precisamos passar pela negociação entre diferentes
grupos dentro do sistema político nacional.
No entanto,
observamos hoje uma divisão na sociedade entre grupos que defendem ideias
opostas e cada vez mais as pessoas parecem menos interessadas em construir
pontes de diálogo com o lado discordante em prol de uma negociação para
alcançar uma solução comum. A polarização política no país assumiu novos
contornos, onde um lado vê o outro como inimigo ou como intelectualmente
inferior¹. Esse fenômeno não é exclusivo da democracia brasileira e é
facilmente observável nos vizinhos Paraguai, Argentina, Venezuela e até mesmo
em democracias mais antigas e consideradas por muitos como exemplares como os
Estados Unidos e Reino Unido.²
O
enfraquecimento da democracia é tema de destaque na imprensa onde previsões terríveis
são apresentadas indo do caos social a conflitos internos e possibilidade de
ditaduras³. Uma unanimidade rara, no entanto, é vista quando esse tema é
apresentado: As redes sociais são responsáveis por boa parte da polarização política
e pela ascensão de políticos menos tradicionais ou com menos visibilidade até
então. Como se chegou a esse patamar e como o futuro das redes sociais pode influenciar
o futuro das democracias do planeta?
Uma das
principais novidades que as redes sociais trouxeram ao mundo foi a
possibilidade de formar grupos de interesse em comum em fóruns de discussão que
depois migraram para grupos de redes sociais mais complexas e bem elaboradas.
Esses grupos vão do entretenimento inocente como um grupo de entusiastas de
figurinhas da copa do mundo até criminosos como neonazistas e predadores
sexuais. À medida que as pautas políticas foram ocupando as redes sociais, foi possível
observar o crescimento da discussão de pautas que até então estavam limitadas
as universidades, mercado financeiro e outros integrantes da elite econômica e
intelectual do país. Com a popularização da internet no país, uma parcela
importante da população que estava totalmente excluída do debate político
passou a discutir e se posicionar através das redes sociais e uma parcela ainda
a utiliza desde então para se informar o que gerou vários problemas com notícias
falsas que até hoje não conseguimos resolver. As redes sociais mostraram seu
potencial de sair do virtual e impactar no mundo real em 2013, quando milhões
de brasileiros foram as ruas em manifestações históricas organizadas a partir
do Facebook começando com páginas como o Movimento Passe Livre que protestavam
contra o aumento das passagens de ônibus e se expandiu crescendo de forma orgânica
até alcançar outros temas como fim da corrupção, melhor educação e saúde.

Manifestantes
ocuparam as pontes de entrada e saída da Ilha de Santa Catarina (Foto:
Alvarélio Kurossu/ Agência RBS)
Fonte:http://g1.globo.com/sc/santa-catarina/noticia/2013/06/cerca-de-89-mil-participaram-de-manifestacoes-em-sc-segundo-pm.html
acessado em 17 de Abril de 2021.
As redes sociais também tiveram
um papel importante nas eleições de 2014 numa disputa acirrada de Dilma Rousseff
contra Aécio Neves onde pela primeira vez durante os debates políticos eram apresentadas
contagens de tweets com a hashtags relacionadas ao debate ao vivo e com
postagens de pessoas acompanhando o programa. Posteriormente surgiram outros
grupos a partir do Facebook como o Vem Pra Rua e Movimento Brasil Livre
(MBL) que conseguiram organizar manifestações pelo país com milhões de pessoas
no total em apoio ao impeachment de Dilma Rousseff. Uma nova geração de
políticos gestados nas redes sociais surgiu como Kim Katamguiri e Fernando
Holiday que são integrantes do MBL. O próprio presidente Bolsonaro foi eleito
praticamente sem tempo de televisão para apresentar suas propostas, se
comunicando com o eleitorado basicamente a partir das redes sociais,
principalmente o WhatsApp. É certo que as redes sociais possuem impacto real na
sociedade, mas a polarização que ganhou destaque vai além do surgimento de
novos atores políticos e de uma nova ferramenta de comunicação.
Manifestantes na Avenida Paulista, em São Paulo, para o protesto contra o Governo Dilma, pedindo o impeachment da presidente petista e o fim da corrupção Leo Pinheiro/VEJA.com
Fonte:https://veja.abril.com.br/brasil/movimentos-adiam-atos-de-31-de-julho-a-favor-do-impeachment/
acessado em 17 de Abril de 2021.
As redes sociais foram construídas para prender a
atenção do usuário e a empresa lucra com os comerciais que estão inseridos na
linha do tempo infinita que é disposta de forma que as pessoas passem o maior
tempo possível entretidas na rede. “Nós não somos clientes das redes sociais –
Somos seus produtos” (HARARI; YURVAL, 2015 posição 1376) Para cumprir essa
função de prender a atenção do usuário, o conteúdo apresentado a
partir da similaridade com outros conteúdos vistos anteriormente. Quando a
pessoa interage com regularidade com uma página de conteúdo específico, a rede
tende a reduzir conteúdo divergente o que coloca as pessoas em bolhas de
informações, populadas por pessoas que pensam de forma parecida. Uma pessoa crítica
ao presidente por exemplo tende a ver mais publicações de pessoas que também
são críticas, justamente pela possibilidade de que você interaja com aquela
publicação e permaneça mais tempo na rede. Uma pessoa que apoia o presidente
certamente vai ver em sua linha do tempo mais conteúdo elogioso ao governo, que
reforçam os pontos considerados positivos ou que apoiam o governante. Isso tem
relação com a tendencia de nos relacionarmos com pessoas parecidas, mas
principalmente pela segmentação prévia feita pela rede social que priva os
usuários de ver publicações discordantes com intuito de manter as pessoas
consumindo publicidade nas redes por mais tempo.
Soma-se a isso o fato de que a maior fatia de usuários de redes sociais no Brasil são pessoas que utilizam celulares pré-pagos com planos que incluem redes sociais grátis.5 Nesses planos as pessoas não pagam para utilizar WhatsApp, Facebook e Instagram mas precisam pagar (Consome do crédito) quando entram em um site de notícias por exemplo, o que gerou um fenômeno em que milhões de pessoas passaram a se informam apenas pela manchete postada na rede social, sem entrar no link que detalharia o conteúdo. Os robôs que fazem publicações em perfis falsos nas redes sociais apoiando determinada causa ou pessoa também são uma ferramenta para a tentativa de influenciar o debate político. O escândalo da Cambridge analitica que utilizou o Facebook para tentar influenciar eleitores nos estados unidos e no reino unido, provou o perigo que as redes sociais podem ser se utilizadas por pessoas mal-intencionadas. O futuro da polarização política passa inevitavelmente pela discussão sobre regulamentação das redes sociais e fiscalização dos possíveis mal usos.
Temos indícios de que sem um
acerto de rota, as redes sociais podem criar um ambiente que favorece conflitos
e pode culminar em enfraquecimento da democracia. Contudo, assim como as redes
sociais trouxeram avanços inegáveis na integração da população ao debate político
e na discussão de temas até então escanteados ela possibilita riscos em caso de
mal uso. Para mudar esse cenário os líderes globais precisarão retomar a arte
de negociação e construir pontes para construirmos redes sociais que aproximam
pessoas e buscam solução de problemas ao invés de um ambiente tóxico palco de
uma constantemente luta contra um inimigo que cometeu o erro de pensar
diferente.
Referências
¹Portal UOL, São Paulo, 14 de Abril de 2019 disponível em (https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2019/04/14/radicalismo-politico-no-brasil-supera-media-global.htm), acessado em 17 de Abril de 2021.
²Carnegie Endowment Foundation, Washington, 01de outubro de 2019 disponível em (https://carnegieendowment.org/2019/10/01/how-to-understand-global-spread-of-political-polarization-pub-79893), acessado em 17 de Abril de 2021.
³Correio Braziliense, Brasília, 02 de junho de 2020 disponível em (https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/politica/2020/06/02/interna_politica,860190/maior-polarizacao-e-tensao-politica-colocam-democracia-a-prova-no-bras.shtml), acessado em 17 de Abril de 2021.
4Folha de São Paulo, São Paulo, 27 de dezembro de 2013
disponível em (https://www1.folha.uol.com.br/poder/2013/12/1390207-manifestacoes-nao-foram-pelos-20-centavos.shtml),
acessado em 17 de Abril de 2021.
Bibliografia
HARARI, Yuval, Homo Deus, 1ª
Edição, Israel, Editora Companhia das Letras, 2016.
HARARI, Yuval, 21 lições para o século 21, 1ª Edição, Israel, Editora Companhia das Letras, 2018.
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