A educação, desde os primórdios dos tempos, é revestida pela tecnologia. O binarismo entre educação e tecnologia tem raízes interligadas, a começar pela etimologia das palavras que o compõem. De acordo com o Dicionário Etimológico: etimologia e origem das palavras, o vocábulo educação, do latim educare, é a junção do prefixo ex, cujo significado é “fora”, “exterior”, e ducere, que tem o sentido de “guiar”, “instruir”, “conduzir”. O termo tecnologia, do grego tekhne, remete à “técnica, arte, ofício”. A ele é agregado o sufixo logia que significa “estudo”. Educar é, portanto, conduzir para o mundo exterior e, ao mesmo tempo, para fora de si mesmo. Para tanto, é preciso ter técnica, planejar, estudar. Não por acaso, a educação tem estreita ligação com a tecnologia, tendo em vista a grande necessidade do indivíduo em se socializar.
A busca por algo que pudesse facilitar a vida em comunidade e as ações cotidianas, então, fez surgir uma das primeiras tecnologias criadas pelo homem: a linguagem. É através da linguagem que a comunidade se comunica e retrata o conhecimento e entendimento de si própria e do mundo que a cerca. É na linguagem que se refletem a identificação e a diferenciação de cada comunidade. Ainda que ocorra também a inserção do indivíduo em diferentes agrupamentos, estratos sociais, faixas etárias, gêneros, graus de escolaridade.
Os povos primitivos, muito aquém da escolarização, em seus diversos agrupamentos, já tinham grande preocupação com a educação. Os mais velhos, por meio da linguagem, repassavam para as gerações mais novas os conhecimentos essenciais para a vida em sociedade. Com a evolução humana, a invenção da fala permitiu a junção da educação com a tecnologia do diálogo e da escrita. Na Grécia, Sócrates foi o principal educador a valorizar esse estágio de desenvolvimento tecnológico, por meio da arte da eloquência,para o pleno desenvolvimento do falar bem e do persuadir.
Por esse motivo, as primeiras escolas foram criadas sob a influência da cultura grega, que, apesar de receber críticas por ser muito rígida, era o modelo mais difundido, dado o valor à eloquência, importante para a vida em sociedade. No entanto, conforme a autora, com as conquistas do império romano sobre os demais, a língua latina passou a ter grande força linguística e status de uso para funcionalidades comunicativas no ensino, isso pelo motivo de a Igreja ser detentora do poder e os religiosos, consequentemente, terem maior acesso à educação e a responsabilidade de transmitir os ensinamentos.
A tecnologia instaurada na educação dessa época, então, por intermédio da linguagem, acaba por validar que a linguagem falada e escrita, pela lógica do significante, são as palavras que agem sobre o sujeito com peso de verdade, que o tocam profundamente a ponto de constituí-lo, como se fossem proferidas por um ser muito superior. Nessa perspectiva, a educação teve maior avanço tecnológico por intermédio dos textos latinos religiosos, que eram utilizados para o cultivo.
Séculos depois, especificamente, por volta de 1650, a educação formal esteve às voltas com aparatos tecnológicos como o Horn-Book, Uma madeira, com impressos, utilizada para alfabetização de crianças, no século XIX, foi a vez do Ferule, espécie de espeto de madeira, que servia como apontador/indicador tanto para aprendizagem como para castigo físico imputado a alunos dispersos e/ou que não conseguiam aprender.
Essas e outras tecnologias deram origem aos devices atuais, pois foi criada a Magic Lantern em 1870, precursora do projetor de slides. Passamos depois pelo School Slate em 1890, seguido pelo Chalkboard, ambos percussores do quadro negro/branco, também de 1890. Finalizamos a era das criações com o lápis em 1900.
Depois da invenção tecnológica do objeto de escrita, o lápis, considera-se que as invenções tiveram apenas melhoramentos, ou seja, foram aperfeiçoadas com base nas já existentes. Então, em meados da segunda década do século XX, surgiu o rádio, inserindo a escola na era da modernidade tecnológica.
É exatamente o rádio que, no Brasil, fez com que o uso das tecnologias estivesse, primeiramente, voltado para o ensino a distância, uma vez que o Instituto Rádio-Monitor, em 1939, e o Instituto Universal Brasileiro, em 1941, realizaram as primeiras experiências educativas com o rádio. Entre essas experiências destaca-se a criação do Movimento de Educação de Base (MEB), que visava alfabetizar e apoiar a educação de jovens e adultos por meio das escolas radiofônicas. De 1967 a 1974 foi desenvolvido o Sistema Avançado de Comunicações Interdisciplinares (Projeto Saci) com a finalidade de usar o satélite doméstico, utilizando o rádio e a televisão como meios de transmissões com fins educacionais.
A tecnologia vem se transformando ao longo dos séculos. Em meio à evolução, cria novas formas, possibilitando maior informação e comunicação. Chega-se então ao século XXI, e em plena pandemia da Covid-19, que imputou a todos o isolamento social, emergiu, dentre as inúmeras situações surgidas nas unidades de ensino presencial, uma discussão muito pertinente: a necessidade de se estabelecer o ensino de maneira não presencial.
Inicialmente, alguns sistemas de ensino utilizaram tecnologias como o rádio e a televisão como meios de transmissões com fins educacionais. O objetivo era atender a maioria dos educandos, até que outras estratégias tecnológicas fossem pensadas.
Para tanto, é urgente uma maior compreensão das TDIC. As Tecnologias Digitais da Informação e da Comunicação surgem na década de 1960, integrando informática e telecomunicação, ao ampliarem o potencial das mídias mais tradicionais ou ao criarem novos recursos tecnológicos.
As mídias, consequentemente, foram hibridizando-se ou convergindo-se em um processo evolutivo que foi passando, gradativamente, do analógico ao digital, chegando às tecnologias sem fio. Com isso, a lógica na relação tecnologia-indivíduo foi alterada: do “um-para-todos” ou “um-para-muitos”, agora para o “todos-para-todos” ou “muitos-para-muitos”. Essa relação torna-se cada vez menos dependente do tempo ou do lugar é ainda mais interativa, explorando intensamente a hipertextualização e múltiplas linguagens nas mais diversas mídias.
O digital produz assim uma transformação na discursividade do mundo nas relações históricas, sociais e ideológicas, na constituição dos sujeitos e dos sentidos. Ocorre, pois, uma ressignificação: as TDIC se conectam à vida dos sujeitos sociais como mecanismos de complementação e extensão do ser.
As tecnologias estão assumindo cada vez mais um caráter ubíquo na nossa sociedade, pois usamos os recursos tecnológicos de modo tão natural que nem percebemos que estamos fazendo uso ou que por eles somos influenciados.
As TDIC incidem tanto no nível individual quanto no social, a organização dessa nova ecologia cognitiva midiática, ou ecologia digital, caracterizada, fundamentalmente, por ser mais interativa e colaborativa, contribui para a expansão das múltiplas relações entre o local e o global.
Essa influência precisa ser considerada e, neste momento, a forma de poder ofertar a formação aos estudantes, necessita ocorrer por meio de ferramentas como as TDIC. Essas tecnologias são validadas pelo mais novo documento da Educação Básica, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), como protagonistas de muitos processos educativos, pois a contemporaneidade é fortemente marcada pelo desenvolvimento tecnológico. Tanto a computação quanto as TIDCs estão cada vez mais presentes na vida de todos, não somente nos escritórios ou nas escolas, mas nos nossos bolsos, nas cozinhas, nos automóveis, nas roupas, etc. Além disso, grande parte das informações produzidas pela humanidade está armazenada digitalmente. Isso denota o quanto o mundo produtivo e o cotidiano estão sendo movidos por tecnologias digitais, situação que tende a se acentuar fortemente no futuro.
Esses apontamentos denotam realizar reflexões sobre a aplicação das TIDCs nas práticas de sala de aula, a fim de efetivá-las adequadamente nestes tempos de profundas mudanças, em que a nova trincheira aberta na educação permitirá, durante o combate à Covid-19, a movimentação da “tropa”, quer sejam, os diretamente envolvidos com a educação, e o “tiro certeiro” a ser disparado pela utilização das TDIC, a fim de vencer mais essa história que se desenha no universo educativo.
REFERÊNCIAS
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