Já se sentiu limitado por um software?
O acesso à tecnologias e aparelhos eletrônicos hoje é uma realidade na vida das pessoas. Além disso, tendo notado ou não, você provavelmente já teve contato com algum software. Nesse sentido, levanta-se uma pergunta: você já quis ou precisou usar um programa, mas ele era "pago"?
Entrando um pouco mais na experiência de uso de um software, já se sentiu de alguma forma limitado pelo programa:
- "Gostaria que esse aplicativo fizesse uma ação 'X' "
ou pela empresa dona dele:
- "A única ajuda que posso obter para o meu problema no uso desse programa é da empresa dona ou de uma atualização que ela distribui"
- "Eu, que não adquiri o direito ao uso do programa, não posso acessá-lo mesmo que um usuário legal me permita."
Se você esta lendo esse texto, infere-se que já utilizou um hardware e um software alguma vez na vida, então provavelmente já passou por alguma das situações descritas acima. Isso implica então que você já esteve limitado por uma empresa dona de software.
É possível não sofrer tal limitação? O que a noção de rede tem a ver com tudo isso?
O que são os Softwares Livres?
Figura 1: Linux
Fonte: Domínio Publico
Na década de 80, surgiam grandes empresas que detêm boa parte o mercado de computadores e softwares atualmente, como a Microsft e a Apple, por exemplo. Elas desenvolvem softwares muito comuns no dia-a-dia das cidades atualmente, como o Microsft Office e o iTunes, que são exemplos de "softwares proprietários" ou "softwares comerciais", ou seja, as empresas criadoras possuem direitos de propriedade (copyright) sobre esses programas.
Esses copyright ou Direitos Autorais definem quem compra o programa como "usuário" e impõem limitações contratuais a esse usuário como a proibição de distribuição, a não ser com um consentimento legal do autor (Lei nº9.610/1998).
Por um lado, esses Direitos Autorais são importantes para proteger e resguardar os autores de uma obra em sua comercialização. Por outro, no caso dos softwares, criam uma relação de subordinação entre Donos e Usuários. Como explica Rafael Evangelista (2009):
Quando o consumidor vai até uma loja de software e compra uma caixa contendo os CDs de instalação de algum programa, essa pessoa está, na verdade, adquirindo apenas o direito de usar aquilo. Ela nunca será dona do software, que continua de propriedade de seus autores. [...] Os verdadeiros donos, os detentores dos direitos autorais ou das patentes, colocam certas restrições para os usuários, estipulando o que ele pode fazer ou não com o programa. Na prática, é como se as gravadoras pudessem dizer em que aparelho os CDs (de música) podem ser tocados ou como se uma editora pudesse limitar quem pode ler os livros que ela publica.
Indo contra essa ideia, em 1985, um integrante do MIT, Richard Stallman, cria o movimento do Software Livre. Segundo o site gnu.org, entende-se o Software Livre como "aquele software que respeita a liberdade e senso comum dos usuários. Grosso modo, isso significa que os usuários possuem liberdade de executar, copiar, distribuir, estudar, mudar e melhorar o software". Ou seja, não se trata apenas de um programa que pode ser baixado gratuitamente, e sim de uma ferramente que pode ser usada, adaptada e distribuída pelo usuário para contribuir para a rede.
Além disso, toda a noção de software livre se baseia em um preceito básico: o código-fonte deve ser aberto. Só assim é possível a um usuário realmente ser capaz de estudar o que o programa faz e de melhorá-lo como desejar.
Para ser considerado um Software Livre, por definição, o programa deve possuir quatro liberdades essenciais:
- Liberdade 0: Liberdade de uso - Executar o programa como você desejar para qualquer propósito.
- Liberdade 1: Liberdade de entender/modificar - Estudar como o programa funciona e adaptá-lo às suas necessidades.
- Liberdade 2: Liberdade de copiar - Liberdade de redistribuir cópias para quem desejar.
- Liberdade 3: Liberdade de distribuir - Distribuir cópias de suas versões modificadas para a comunidade.
Resumidamente, o conceito de software livre muda a estrutura de relacionamento entre "donos" dos programas e os usuários - de uma relação hierárquica para uma rede ou comunidade (onde todos se tornam donos):
Figura 2: Padrão comercial de softwares comerciais
Figura 3: Estrutura em rede dos softwares livres
Como surgiu esse movimento?
Atualmente a estrutura mais conhecida que representa esse movimento é o sistema operacional GNU/Linux. Esse sistema se iniciou com o já citado Richard Stallman criando um grupo de programas e ferramentas livres, com o código-fonte aberto - conjunto chamado de GNU. E em 1992, como explica Ronaldo (2007), "o finlandês Linus Torvald conseguiu compilar todos os programas e ferramentas do movimento GNU em um kernel, um núcleo central, o que viabilizou o sistema operacional."
Figura 4: GNU
Fonte: gnu.org
Além disso, também era necessário criar um respaldo legal para esses programas que impedisse um usuário oportunista de bloquear o desenvolvimento compartilhado por meio de uma patente ou apropriação indevida. Nesse sentido, criou-se a Licença Pública Geral (do inglês GPL). Evangelista (2009) explica esse item da GPL:
O que ela (GPL) estabelece não é algo que se restringe a um contrato entre licenciador e licenciado. Ela fala de uma terceira pessoa que não está no contrato, colocando restrições à relação do licenciado (licenciante naquele momento) com os novos licenciados que surgirão no futuro. Impede que o licenciador assuma uma condição diferente do licenciado, de modo que possa estabelecer a outros restrições maiores do que as que foi objeto.
Isso significa, em outras palavras, que o usuário é livre para usar o programa como quiser. Mas se deseja redistribuir cópias (Liberdade 2) ou distribuir modificações que criou (Liberdade 3) ele deve manter o programa livre, assim como o recebeu.
E assim estava estabelecido todo o campo necessário, legal (GPL) e tecnicamente (Sistema Operacional GNU/Linux), para o crescimento do movimento em rede dos softwares livres.
É possível ganhar dinheiro?
Como já explicado, os Softwares Livres inserem a noção de rede e compartilhamento entre usuários e desenvolvedores. Isso implica diretamente na parte financeira dessa relação. O foco deixa de ser um criador que ganha dinheiro com o uso de sua patente e passa a ser o desenvolvimento e crescimento em rede.
Por exemplo, deixa de existir uma empresa vendedora de pacotes de softwares e passa a existir uma comunidade de desenvolvedores, técnicos e engenheiros que são capazes de dar os mais diversos tipos de suporte a usuários e criar soluções únicas (como um recurso específico adaptado à uma empresa cliente). Nota-se que a cobrança não é feita em cima do programa, e sim no serviço que as pessoas oferecem, serviço esse que é feito com base no conhecimento técnico e intelectual que aquela pessoa possui.
O governo brasileiro é um dos pioneiros no uso de softwares livres na América Latina (Rafael Evangelista, 2009) e possui um portal que funciona como uma janela de comunicação dos esforços que estão sendo feito nesse sentido no país. Nele, temos o caso do Banco do Brasil, que exemplifica esse ponto da relação financeira na rede dos Softwares Livres:
Estudos realizados por consultorias apontam que as soluções em software livre estão cada vez mais presentes presentes nas grandes empresas e as que mais crescem em número de desenvolvedores e usuários já passam da casa dos milhões. Os grandes players de TI como IBM, Intel e Sun possuem áreas específicas para o desenvolvimento dessas soluções, empregando centenas de milhares de profissionais em áreas como kernel Linus, suporte a hardware, segurança, banco de dados e protocolos abertos. Essas empresas trabalham em conjunto e aplicam com êxito o modelo colaborativo de desenvolvimento, diminuindo seus custos de desenvolvimento, padronizando métodos e minimizando barreiras na migração de sistemas proprietários.
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A opção pelo software livre também beneficiou o corpo técnico do BB, que passou a contar com maiores recursos para o desenvolvimento de aplicativos, levando-os conseqüentemente ao aprimoramento profissional, perenidade e evolução do conhecimento, independência e domínio das tecnologias empregadas num horizonte de tempo maior. Também foi beneficiada a comunidade de software livre que, a partir da implantação em larga escala de soluções livres no BB - considerado o maior caso de uso destas tecnologias na América Latina -, ganhou força e notoriedade no mercado nacional e internacional.
Existem desvantagens?
Umas das principais desvantagens do uso de softwares livres, como alegam blogs, artigos e até mesmo dirigentes da Microsoft, como compilou Rafael Evangelista, é a descentralização da produção dos softwares, a existência de diversos desenvolvedores. Isso tem algumas consequências, por exemplo:
- Despadronização - Interfaces, processos de instalação e outras relações entre usuário e software por vezes são inconstantes;
- Forks - Muitos projetos paralelos de um programa são criados a partir de um código-base inicial, gerando muitas versões instáveis ou incompatíveis que se espalham pela rede;
- Descapacitação - Enquanto a rede não se desenvolver o suficiente, recursos como suporte e ajuda serão escassos ou caros.
Softwares Livres e os Open Source
Figura 5: OSI - Open Source Iniciative
Fonte: opensource.org
Outra linha de pensamento que existe nesse meio são os chamados Open Source. Apesar de muito similares, o objetivo dessa vertente é basicamente construir programas com a melhor qualidade técnica possível, usando para isso toda uma rede de usuários e desenvolvedores de forma colaborativa. Esse vídeo do You Tube explica de forma muito didática e simples essa diferença:
Vídeo: Software Livre x Código Aberto - Paulo Kretcheu
Fonte: You Tube
Em resumo, apesar de muito parecidos, por toda a noção de colaboratividade em rede no desenvolvimento de softwares e uso de programa com códigos-fonte abertos, essas duas vertentes tem objetivos claramente diferentes: o movimento do Software Livre prima pela liberdade do usuário de fazer o que deseja com o software enquanto o Open Source Iniciative busca uma qualidade técnica excelente a partir da colaboração.
Conclusão
O Movimento do Software Livre, criado a décadas atrás tem uma noção muito atual: colaboração e trabalho em rede. Busca defender a liberdade do usuário dos softwares em relação à centralização que as grandes empresas do ramo trazem ao mercado.
As quatro liberdades estabelecidas na sua definição (Uso, Entender/modificar, Cópia e Distribuição) são essenciais para entender o que o movimento argumenta, as vantagens que trás de fato para os usuários e as possíveis desvantagens.
Referências
EVANGELISTA, Rafael - Política e Linguagem nos debates sobre software livre - LIVRO: Software Livres, Cultura Hacker e o Ecossistema de Colaboração, São Paulo: Momento Editorial, 2009.
LEMOS, Ronaldo; JÚNIOR, Sérgio Vieira Branco - Copyleft, Software livre e Creative Commons: A nova Feição dos Direitos Autorais e as Obras Colaborativas - Revista de Direito Administrativo ATLAS, 2007.
Constituição Federal - Lei 9.610 de 1998 - Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9610.htm
dos SANTOS, Dinis Agostinho - Estamos no Caminho Certo - Portal Nacional do Software Livre - Disponível em http://www.softwarelivre.gov.br/artigos/estamos-no-caminho-certo/
Página oficial GNU - Disponível em https://www.gnu.org/
KRETCHEU, Paulo - Vídeo: Software Livre x Código Aberto - Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=N0NNnq0Wyww
http://marcellamontserrat.blogspot.com.br/2009/12/vantagens-e-desvantagens-do-software.html
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